Cozinhar comida ajudou cérebro a se desenvolver, afirma estudo
Um artigo
publicado hoje (23) na revista científica "PNAS" dá apoio à tese de que
cozinhar comida foi determinante para o desenvolvimento do cérebro
humano.
Duas pesquisadoras da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ), Suzana Herculano-Houzel e Karina Fonseca-Azevedo,
mostraram que uma dieta baseada em comida crua impôs limitações
energéticas aos grandes primatas, criando um "dilema" para o corpo entre
o crescimento da massa corporal e o do cérebro.
Isso explicaria o fato de que grandes primatas possuem corpos
desproporcionalmente grandes em relação aos seus cérebros. "Outros
grupos já haviam indicado que o cérebro custa caro em termos de energia e
sugerido que esse custo teria influenciado nossa história evolutiva,
mas ninguém havia ainda determinado se esse custo era de fato relevante e
limitante em termos fisiológicos", disse Suzana.
Ela explica que nossas habilidades mais sofisticadas não são o
resultado de o "cérebro ser maior do que deveria, dado o tamanho do
nosso corpo", e sim do número absoluto de neurônios - 86 bilhões no
cérebro humano. Suzana já havia mostrado, em artigo científico publicado
no ano passado, que acrescentar neurônios ao cérebro, aumentando o
tamanho do órgão, custa ainda mais caro do que se imaginava em termos de
energia.
No estudo publicado agora, as pesquisadoras desenvolveram um modelo
que relaciona o número de calorias ingeridas numa dieta de comida crua à
quantidade de energia necessária para o crescimento da massa corporal e
do correspondente número de neurônios.
Elas conseguiram, dessa forma, estipular o número de horas que
grandes primatas teriam precisado para desenvolver um corpo avantajado e
um número grande de neurônios no cérebro. Mostraram, assim, que teria
sido insustentável para gorilas e orangotangos, entre outros, com as
horas de alimentação de que dispõem, adquirir calorias em número
suficiente para tal tarefa.
"Humanos e grandes primatas são o resultado atual de duas linhagens
diferentes, com duas estratégias diferentes de investimento energético:
ou um corpo enorme, às custas de abrir mão de um número maior de
neurônios, ou um número grande de neurônios às custas de um corpo
menor", diz ela. "As duas estratégias são visíveis na linhagem que levou
aos grandes primatas e aos primeiros exemplares do gênero Homo [o do
homem]."
Mudança alimentar - As conclusões do artigo
fortalecem a tese do primatologista britânico Richard Wrangham, que
defende que um dos momentos mais importantes da evolução humana foi a
invenção da comida cozida, mais fácil de mastigar, de digerir e de ter
suas calorias absorvidas. "Sugerimos que foi por causa de uma mudança
qualitativa na alimentação que a limitação energética da nossa linhagem -
que já vinha investindo em mais neurônios e menos corpo - foi
contornada", acrescenta Suzana.
"Além de aumentar a capacidade calórica e tornar as limitações
metabólicas prévias irrelevantes, cozinhar também teria aumentado nosso
tempo disponível para atividades sociais e que demandassem maior poder
cognitivo", escrevem as pesquisadoras no artigo.
Fonte: JC e-mail 4609, de 23 de Outubro de 2012
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