Sob sigilo, Dom Pedro I e suas duas mulheres são exumados pela primeira vez
Restos
mortais de Dom Pedro I, o primeiro imperador brasileiro, e de duas
imperatrizes foram exumados para estudos; corpos estavam no Parque da
Independência, na zona sul de SP, desde 1972
Portal Estadão.com.br |
Pela primeira vez em quase 180 anos, os restos
mortais de Dom Pedro I, o primeiro imperador brasileiro, foram exumados
para estudos. Também foram abertas as urnas funerárias das duas mulheres
de Dom Pedro I: as imperatrizes Dona Leopoldina e Dona Amélia. Os
corpos estavam no Parque da Independência, na zona sul da capital
paulista, desde 1972.
Os exames - realizados em sigilo entre fevereiro e setembro de 2012
pela historiadora e arqueóloga Valdirene do Carmo Ambiel, com o apoio da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) - revelam
fatos desconhecidos sobre a família imperial brasileira, agora
comprovados pela ciência, e compõem um retrato jamais visto dos
personagens históricos.
Agora se sabe que o imperador tinha quatro costelas fraturadas do
lado esquerdo, o que praticamente inutilizou um de seus pulmões - fato
que pode ter agravado a tuberculose que o matou, aos 36 anos, em 1834.
Os ferimentos constatados foram resultado de dois acidentes a cavalo
(queda e quebra de carruagem), ambos no Rio, em 1823 e em 1829.
Ao realizar o inventário do caixão de Dom Pedro, nova surpresa: não
havia nenhuma comenda ou insígnia brasileira entre as cinco medalhas
encontradas em seu esqueleto. O primeiro imperador do Brasil foi
enterrado como general português, vestido com botas de cavalaria,
medalha que reproduzia a constituição de Portugal e galões com formato
da coroa do país ibérico. A única referência ao período em que governou o
Brasil está na tampa de chumbo de um de seus caixões (ele estava dentro
de três urnas), na qual foi gravado "Primeiro Imperador do Brasil" ao
lado de "Rei de Portugal e Algarves".
Ao longo de três madrugadas, os restos mortais da família imperial
brasileira foram transportados da cripta imperial, no Parque da
Independência, à Faculdade de Medicina da USP, na Avenida Doutor
Arnaldo, em Cerqueira César, onde passaram por sessões de até cinco
horas de tomografias e ressonância magnética. Pela primeira vez, o maior
complexo hospitalar do País foi utilizado para pesquisas em personagens
históricos - na prática, Dom Pedro I, Dona Leopoldina e Dona Amélia
foram transformados em ilustres "pacientes", com fichas cadastrais,
equipe médica própria e direito a bateria de exames.
No caso da segunda mulher de Dom Pedro I, Dona Amélia de
Leuchtenberg, a descoberta mais surpreendente veio antes ainda de que
fosse levada ao hospital: ao abrir o caixão, a arqueóloga descobriu que a
imperatriz está mumificada, fato que até hoje era desconhecido em sua
biografia. O corpo da imperatriz, embora enegrecido, está preservado,
inclusive cabelos, unhas e cílios. Entre as mãos de pele intacta, ela
segura um crucifixo de madeira e metal.
O estudo também desmente a versão histórica - já próxima da categoria
de "lenda" - de que a primeira mulher, Dona Leopoldina, teria caído ou
sido derrubada por Dom Pedro de uma escada no palácio da Quinta da Boa
Vista, então residência da família real. Segundo a versão, propalada por
historiadores como Paulo Setúbal, ela teria fraturado o fêmur. Nas
análises no Instituto de Radiologia da USP, porém, não foi constatada
nenhuma fratura nos ossos da imperatriz.
"Unimos as ciências humanas, exatas e biomédicas com o objetivo de
enriquecer a História do Brasil. A cripta imperial foi transformada em
laboratório de especialidades, com profissionais usando os equipamentos
mais modernos em prol da pesquisa histórica", disse a pesquisadora, que
defendeu hoje pela manhã sua dissertação de Mestrado na USP, após três
anos trabalhando sob sigilo acadêmico. "O material coletado será útil
para que as pesquisas continuem em diversas áreas ao longo dos próximos
anos."
A reportagem do Estado de São Paulo acompanha os estudos de
Valdirene desde 2010, quando a historiadora e arqueóloga conseguiu
autorização dos descendentes da família imperial para exumar os restos
mortais dos personagens históricos. Veja neste especial todos os
detalhes de um estudo que reescreve detalhes da história do Brasil -
confirmando algumas informações, desmentindo outras e adicionando novas
verdades.
Fonte: JC e-mail 4667, de 19 de Fevereiro de 2013
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