O mergulho de uma pedra nas águas do Bacamarte
Thomas Bruno Oliveira*
Pela terceira vez no ano (no último 04 de maio), o sítio arqueológico Pedra do Ingá imerge nas águas do Riacho Bacamarte, evento antes ocorrido só no inverno de 2004. A Pedra do Ingá é um conjunto de painéis de inscrições rupestres gravadas em dura rocha gnaisse no sítio Pedra Lavrada, distante cerca de 5km da zona urbana do município de Ingá.
![]() |
Pedra do Ingá parcialmente coberta. SPA |
As inscrições gravadas foram realizadas há milênios pelos nativos que habitaram estas terras e se conservam até hoje devido às condições ambientais existentes até algumas décadas passadas, precisamente os começos do século XX. Hoje em dia, a mata ciliar não é suficiente para o equilíbrio térmico da pedra durante o dia, causando o “acebolamento” da rocha, onde suas camadas superficiais são desprendidas devido ao ato contínuo de dilatação (com o calor do dia) e o resfriamento (a noite, com o frio). Com a mata ciliar recomposta, haveria uma menor exposição ao sol e este efeito seria reduzido.
O Riacho Bacamarte nasce na antiga “lagoa do véi Pedro”, em Nova Brasília, bairro de Campina Grande-PB. Seu curso se dá pela Serra da Cachoeira, região de declive na zona leste da cidade, com destino a Pedra do Marinho. Da zona rural de Campina, o regato segue pelas cidades do Riachão do Bacamarte, Ingá e Mogeiro, desaguando no Rio Paraíba no lugar chamado de Dois Riachos.
As águas do Bacamarte recebem forte poluição dos esgotos de Campina Grande, Riachão do Bacamarte e Ingá (inclusive do hospital desta cidade), tornando o curso d’água danoso a saúde humana na maior parte do ano. A poluição também é um risco a integridade do sítio arqueológico Pedra do Ingá, pois sendo formado por águas poluídas, repleta de substâncias químicas, estas atingem a pedra e podem asseverar o processo de esfoliação das camadas superficiais de todo o pedregal, sobretudo, das regiões onde existem inscrições gravadas e não só isso, os fortes enxurros trazem uma série de materiais sólidos que se chocam violentamente contra a Pedra e que podem trazer danos irreparáveis a este importante documento lítico.
![]() |
A força das águas. Pedra do Ingá coberta pelas águas. SPA |
O espetáculo da cheia do Bacamarte, descendo em corredeira, submergiu a Pedra. Evento interessante de se ver, porém, danoso ao patrimônio arqueológico ali existente. Se faz necessário que as instituições de preservação do patrimônio, assim como o poder municipal, reflitam sobre a possibilidade de se desviar este curso d’água, a fim de garantir vida longa a este que é um dos sítios arqueológicos mais populares do Brasil e do Mundo.
*Historiador, Presidente da SPA. thomasarqueologia@gmail.com - @thomashistoria
0 comentários:
Postar um comentário